Em um mundo cada vez mais globalizado o profissionalismo é fundamental, em qualquer área profissional, eu, particularmente, me interesso pelo tema relacionado a gestão, seja de empresa, processos ou projetos. Na medida do possível procuro ler artigos a respeito, segue abaixo um artigo do grande jogador de xadrez Garry Kasparov, já li e re li este artigo inúmeras vezes, na minha opinião é o artigo que melhor define o comportamento do profissional do século XXI.
O impensável e o mundano
Geralmente não costumamos relacionar o jogo de xadrez com a coragem, e com toda razão. Afinal de contas, xadrez é um jogo, não uma questão de vida ou morte. Neste artigo, Garry Kasparov, o melhor jogador de xadrez que o mundo já conheceu, revela a relação entre o xadrez e o mundo dos negócios.
Por Garry Kasparov
Observar uma partida de xadrez também não nos diz muito: parece que nada acontece - duas pessoas se olham, pensam e, ocasionalmente, inclinam-se para frente para mover uma peça. Numa partida de xadrez, a atividade física mais arriscada consiste em pressionar o botão que coloca em funcionamento o relógio de nosso oponente.
Porém, quando penso no meu trabalho, eu o entendo como a paixão da minha vida, e claro que para mim significa muito mais do que uma partida. Embora não exija coragem moral física, pelo menos exige audácia e ousadia. Na realidade, sem estas qualidades, um jogador, até mesmo um grande jogador, não tem possibilidade de alcançar posições de destaque. Em última instância, o que separa um vencedor de um perdedor, em termos de expertise, é a vontade de fazer o impensável.
De fato, uma brilhante estratégia é uma questão de inteligência, mas a inteligência sem a audácia não é suficiente. Chegada a oportunidade, devo ter a coragem de explorar o jogo, de desarticular o pensamento de meu oponente e, ao fazê-lo, desconcertá-lo.
O mesmo acontece nos negócios: o sucesso não vem seguindo convencionalismos. Quando seu "oponente" consegue antecipar cada movimento que você faz, sua estratégia se deteriora e se transforma numa commodity. Então, sim, um pouco de coragem torna-se fundamental. Mas essa coragem tem de estar temperada com qualidades menos glamourosas.
Por um lado, o jogo requer a disciplina de pensar muito além do presente - e muito além de você mesmo. Não apenas no seu lado do tabuleiro, mas também no de seu oponente. Para cada movimento que você imaginar, tem de calcular mentalmente a resposta de seu oponente, não só a resposta imediata, mas também 10 ou 15 movimentos antecipados.
Nos níveis mais altos do xadrez, antes de mover uma peça, você já tem que ter na sua cabeça a jogada completa, movimentos e "contra movimentos". De fato, você terá de pensar por duas pessoas. O mesmo acontece nos negócios, um estrategista de sucesso não apenas pensa em seus novos produtos, preço e marketing, mas também de que forma responderão seus rivais e como responder a eles.
Você pode-se imaginar não fazendo isto? Um executivo inteligente deve compreender que seus concorrentes são pelo menos tão brilhantes quanto ele. Unicamente os mais arrogantes não reconhecem que não têm o monopólio da inteligência, das idéias ou da vontade.
No xadrez, eu sei que meu rival vê tudo o que eu vejo. Mesmo assim eu faço o impensável (um movimento audaz e sem precedente que imagino... vai deixá-lo de queixo caído). Tenho de supor que ele o antecipou e que vai ter uma resposta igual de ousadia. Digamos que é a coragem de aceitar a humildade.
E, apesar de tudo o que eu disse sobre audácia e ousadia, os grandes jogadores de xadrez não podem perder de vista os detalhes mundanos. Nos negócios, poderíamos dizer que é bloquear e abordar as operações diárias que, se não forem atendidas, prejudicarão a organização. Um movimento mal pensado, ou uma falta de movimento sem conseqüências aparentes no momento presente, pode nos deixar para trás.
Faz alguns anos, num torneio em Linares, na Espanha, passei de um triunfo para uma derrota porque não tomei um peão. Teria sido um simples movimento que não requeria um grande esforço, como ficar quieto. Pensei que poderia tomar o peão a qualquer momento e concentrei todas minhas energias em outras partes do tabuleiro. Mas então, o jogo complicou e de repente foi tarde demais. Percebi que estava perdendo porque não tive a coragem de fazer um movimento simples.
Esta é a sublime tensão que define o xadrez: a distinção entre o impensável e o mundano. Em todo caso, o resultado da partida está por um fio. Cada movimento tem conseqüências que mudarão o jogo e isso requer paciência, estilo e respeito pelo oponente. Para mim, este é um contexto que alimenta o pensamento ousado. Para mim, não seria o mesmo de outra maneira.
Autor: Garry Kasparov, indiscutivelmente o maior jogador de xadrez de todos os tempos. Ele se tornou campeão mundial júnior aos 16 anos e, em 1985, tornou-se o mais jovem World Champion, aos 22 anos.
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